Por Fabiola Sena, D.Eng e Rebeka Passos.
Conceitualmente, os arranjos híbridos e associados são aqueles formados a partir da combinação de duas ou mais tecnologias de geração de energia elétrica. No arranjo tradicional (usinas adjacentes), cada usina deve contratar montante de uso (MUST ou MUSD) igual ou maior que a potência instalada. Já nos arranjos híbridos ou associados, a contratação de uso da rede é menor do que a soma das potências individuais.
Sendo assim, a principal vantagem dos conjuntos híbridos e associados é que estes contribuem para a expansão da geração, porém exigem menores investimentos na expansão das redes de transmissão e distribuição – podendo, assim, trazer redução de custos para o sistema e consumidores.
É a complementariedade de perfil de geração das diferentes tecnologias que possibilitaria o subdimensionamento do sistema de uso restrito e a otimização da contratação do uso da rede. Mas há, também, outros benefícios, como a otimização do uso da área disponível (terreno ou lago), as sinergias de logística e planejamento de implantação, o compartilhamento de custos fixos de O&M e o compartilhamento de equipamentos de geração (especificamente no caso de usinas híbridas).
O desafio regulatório desses arranjos é que, ao permitirem a contratação do uso da rede com uma potência inferior à soma das potências individuais, devem ser definidas as regras para alocação das perdas associadas à limitação de geração (o chamado curtailment – montante de energia gerada e não aproveitada por limitação do sistema elétrico para escoamento dessa energia) e que esse corte de geração seja automático e obrigatório.
Apesar das resoluções contemplarem multas pela ultrapassagem do montante de uso da rede contratada, os estudos desenvolvidos pela EPE entendem que essas penalizações não são suficientes para o caso de usinas híbridas ou associadas que contratem uma capacidade da rede inferior à potência nominal das usinas envolvidas, pois trazem riscos ao sistema elétrico como um todo caso mais de um gerador decida ultrapassar o limite ao mesmo tempo. Por isso, não está claro a relação do aumento de segurança do sistema a partir da inserção de sistemas híbridos.
Foi em busca da solução para esse desafio, e outras questões regulatórias, que a ANEEL vem, desde 2019, estudando o tema – que está sob a relatoria da Diretora Elisa Bastos e coordenação técnica da SRG (Superintendência de Regulação dos Serviços de Geração):
Junho a agosto de 2019: Consulta Pública 14/2019
Outubro a dezembro de 2020: 1ª fase da Consulta Pública 61/2020
Agosto a setembro de 2021: 2ª fase da Consulta Pública 61/2020
O objeto da CP 61/2020 é, portanto, uma proposta de resolução que altera as Resoluções Normativas 77/2004, 247/2006, 559/2013, 583/2013, 666/2015 e 876/2020. Como a Diretoria Colegiada ainda não decidiu sobre o resultado da CP, o tema segue sem deliberação final.
Há dois principais conceitos definidos no âmbito da CP 61/2020:
As usinas híbridas e associadas compartilham fisicamente e contratualmente a infraestrutura da rede elétrica; e
As diferenças entre híbridas e associadas estão relacionadas à outorga e medição.
A usina híbrida possui outorga única, podendo ter medição única ou distinta por tecnologia. No caso de usina híbrida com tecnologias que possuam diferentes percentuais de desconto de TUST/TUSD, a medição deve ser obrigatoriamente distinta – caso contrário, aplica-se o menor desconto entre as fontes.
Já as usinas associadas possuem outorgas e medições necessariamente distintas. As usinas existentes não podem associar-se entre si, pois já há contratos de uso firmados – o que causaria efeitos redistributivos aos demais usuários. Cabe ressaltar que a proposta permite que uma usina nova se associe a uma usina existente.
Os aproveitamentos hidrelétricos existentes podem ser hibridizados via ampliação da capacidade de geração a partir de outras fontes de energia (caso típico da combinação hidrelétrica + solar fotovoltaica).
A CP 61/2020 traz como proposta para a contratação otimizada da rede, o conceito de Faixa de Potência: a mínima potência a ser contratada pelo conjunto seria a da tecnologia com maior participação, enquanto que a máxima potência seria a soma das potências do conjunto. A geração deve, portanto, ser cortada automaticamente no limite da capacidade da rede contratada pelo conjunto, que deve estar dentro da faixa mencionada.
Sobre associação e hibridização envolvendo usinas participantes do MRE, é importante destacar que a proposta inicial da Agência proibia tal tipo de composição. Porém, após avaliação das diversas contribuições dos agentes, concluiu-se que o funcionamento do MRE não seria afetado se utilizadas medições e garantias físicas individualizadas por tecnologia.
Preocupa, porém, o fato de que empreendimentos que participem do MRE e que não sejam despachados centralizadamente possam arbitrar qual tecnologia será limitada nas situações em que houver potencial ultrapassagem do montante de uso contratado. Esta situação poderia causar prejuízo aos demais agentes do MRE, visto que seria mais um potencial causador de deslocamento hidrelétrico.
Por fim, cabe ressaltar que a proposta de resolução da CP 61/2020 não alcança o ambiente da distribuição, que deve ser tratado em um instrumento à parte. Sendo assim, do mesmo modo que foram propostas modificações na Resolução Normativa 666/2015, que trata da contratação do uso da transmissão, serão necessários ajustes na Resolução Normativa 506/2012, que dispõe sobre as condições de acesso ao sistema de distribuição por meio de conexão a instalações de propriedade de distribuidora.
Comments