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  • Fabiola Sena

Uma nova categoria de volatilidade para o PLD


Ao que tudo indica, 2024 continuará sendo um ano de baixa volatilidade para o PLD (Preço de Liquidação de Diferenças). A volatilidade que aqui alcunho como numérica. As razões para que esse fenômeno permaneça no próximo ano são bem conhecidas pelo mercado:

  • 2023 foi extremamente positivo sob o ponto de vista hidrológico e deve finalizar com reservatórios cheios;

  • a janela de oportunidade aberta pela Lei 14.300/2022, que impulsionou o crescimento da MMGD (Micro e Minigeração Distribuída) e vem reduzindo a carga líquida do país; e

  • a corrida das outorgas, resultado da Lei 14.120/2021, que tem aumentado a oferta estrutural de geração.

Via de regra, os agentes do mercado buscam quantificar a volatilidade do PLD considerando sensibilidades a parâmetros numéricos, tais como os relacionados à meteorologia, hidrologia, armazenamento, disponibilidade de oferta, carga etc. As variáveis que causam a volatilidade numérica excursionam de forma mais ou menos contínua, com uma certa suavidade.


Mas há outra natureza de volatilidade que, sobretudo em tempos de baixa volatilidade numérica, pode surpreender: a volatilidade regulatória. Nessa categoria figuram perturbações de alta volatilidade regulatória (caso de medidas cautelares e Medidas Provisórias inesperadas), média volatilidade regulatória (caso de consultas públicas com tempo suficiente para discussão) e baixa volatilidade regulatória (caso dos Projetos de Lei que costumam ter um ciclo de discussão mais longo).


Os eventos que trazem volatilidade regulatória ao mercado definitivamente não possuem a natureza contínua dos eventos numéricos. A volatilidade regulatória pode ser acionada, em tese, por qualquer agente participante do mercado (geradores, consumidores livres e regulados, comercializadores, distribuidoras e órgãos institucionais).


As motivações para que um agente patrocine um desajuste de natureza regulatória ao mercado podem ser as mais diversas possíveis, mas, em geral, têm alguma conexão com sua exposição ao risco de mercado e suas receitas com venda/compra de energia. Alguns exemplos:

  • Se um conjunto de agentes estiver exposto negativamente no MCP (Mercado de Curto Prazo), aumentando excessivamente seus efeitos financeiros devido à escalada do PLD, estes agentes podem ter interesse em promover uma revisão na metodologia do PLD teto.

  • Se um agente possui expressivo volume de energia a ser vendido em contratos no curto prazo, mas a conjuntura é de PLD baixo, este agente pode ter interesse em promover uma revisão na metodologia do PLD piso.

  • Medidas judiciais podem impactar os valores a serem recebidos por todos os credores na liquidação do MCP, o que pode resultar em spreads negativos sobre os preços praticados no mercado.

  • Alterações nos critérios de aversão ao risco dos modelos computacionais de formação de preços podem afetar diretamente o PLD e, com isso, impactar o acionamento das bandeiras tarifárias – causando repercussões inflacionárias.

  • Há também as alterações capazes de injetar (ou enxugar) oferta (ou demanda) ao mercado de forma bastante abrupta. Alguns exemplos são o recente fim dos descontos na tarifa de uso e a corrida pelas outorgas de geração, uma eventual redução inesperada dos limites de elegibilidade para o mercado livre, e até mesmo a mudança de parâmetros usados no cálculo da revisão ordinária de Garantias Físicas de hidrelétricas.

O atual arcabouço adotado no Brasil para o despacho e formação de preços de curto prazo é baseado em um modelo do tipo tight pool (cost-based), calculado por uma cadeia de modelos computacionais cuja propriedade intelectual é do CEPEL (Centro de Pesquisas de Energia Elétrica).


Dois pontos relacionados à governança destes modelos matemáticos têm sido alvo de preocupação dos agentes de mercado: (i) a qualidade dos dados de entrada, que podem produzir volatilidade numérica artificial ao preço calculado e (ii) a falta de transparência e acesso aos algoritmos internos aos modelos.


A governança de dados e algoritmos, aliada às simplificações intrínsecas à representação do sistema nas ferramentas computacionais, acabam obstando a descoberta do real preço da energia elétrica. Tal fato é evidenciado em situações extremas, caso da escassez hídrica de 2021, seguido pelos elevados níveis de chuva em 2022 e 2023 – nessas situações excepcionais, os preços de curto prazo tendem a ser levados aos limites regulatórios máximo e mínimo.


Os fatores mencionados, bem como a perspectiva de uma ampliação do mercado livre nos próximos anos, vêm dando força à ideia da implementação de um mecanismo de oferta de preços (loose pool ou price-based). Além da implementação de mecanismos para o monitoramento e controle do poder de mercado, é vital que a oferta de preços no Brasil possa conviver harmoniosamente com o despacho físico das usinas hidrelétricas – destaque para o atendimento das restrições operativas associadas ao uso consuntivo da água e a consideração de diferentes proprietários de usina numa mesma cascata.


A discussão sobre qual modelo de formação de preços é o mais adequado para país é certamente um tema cativante. Mas tanto no tight pool quanto no loose pool, o sucesso de um agente de mercado passa por implementar instrumentos para monitoramento e controle dos impactos da volatilidade regulatória, que certamente vai muito além da numérica.


Estar preparado para lidar com o risco regulatório requer um acompanhamento contínuo sobre os mais diversos movimentos de mercado e institucionais: monitoramento de informações sobre o portfólio de ativos e contratos dos competidores, transações em fusões e aquisições, mobilizações de outros segmentos de mercado, interesses políticos e até mesmo como pensam e agem os formadores de opinião.


Saber navegar no mar da volatilidade regulatória é a chave para criação de valor e proteção do fluxo de caixa de um agente de mercado.

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