Por Matheus Barbieri
Quando iniciamos um projeto, seja ele qual for, nos deparamos com diversas incertezas que podem ser traduzidas na forma de riscos. Esses riscos serão o parâmetro no momento de definir os seguros a serem contratados: se forem subestimados, a empresa fica menos protegida; se forem superestimados, a empresa gasta mais do que o necessário com os seguros. Por isso, é de extrema importância para a saúde de uma empresa saber identificar, mensurar e alocar os riscos aos quais está sujeita. A seguir, abordaremos o tema na perspectiva do setor elétrico.
Tipos de riscos
Primeiramente, os riscos podem ser categorizados como (i) “risco do negócio” ou “não seguráveis” ou (ii) riscos “seguráveis”. A característica do primeiro é autoexplicativa. Já a característica do segundo tipo de risco é ser transferível para o mercado de seguros, que o absorverá na forma de uma apólice de seguros.
Como exemplo de riscos do negócio ou não seguráveis, podemos citar os riscos associados a multas, a atrasos na obtenção de licenças, a mudanças regulatórias, à simples mudança no preço da energia, à descoberta de uma geologia desfavorável após projetar a usina e, consequentemente, a mudanças no método construtivo por conta de geologia.
Já os riscos seguráveis podem ser exemplificados como tombamento de carga com transformador, roubo de caminhão levando cabos de cobre, quebra de pá (o que é agravado pela venda ser feita aos pares, ou seja, quebrou uma tem que comprar o conjunto), contaminação ambiental, morte de trabalhador durante a construção ou falência do construtor.
O mais comum em um projeto de construção, por exemplo, é o risco de dano material no projeto, que é transferido para o mercado de seguros através de uma apólice de riscos de engenharia. Sua contratação pode ser feita tanto pelo proprietário quanto pelo EPCista e, nessa apólice, são cobertos eventos associados de testes e comissionamentos, erros de projeto/risco do fabricante, erro de execução, incêndio, danos da natureza dentre outros.
Pactuação de riscos
Os riscos são, em geral, pactuados quando o agente negocia os termos do contrato com sua contraparte. Nele, pactua-se também a alocação dos riscos, os compromissos das partes envolvidas e suas eventuais penalidades em caso do não cumprimento.
É interessante notar que diferentes momentos do ativo exigem diferentes tipos de seguro, visto que os riscos assumidos são também diferentes. Por exemplo:
Fase de pré-construção: seguro garantia, seguro de erro de projeto e seguro de responsabilidade civil profissional
Fase de transporte do material: seguro de transporte, que pode abarcar todo o percurso que o componente faz ou apenas parte dele (imagine uma placa solar que vem da China e, então, passa pelo porto chinês, pelo carregamento no navio, pela travessia, pelo porto brasileiro e pelo percurso até o canteiro de obras)
Construção do empreendimento: seguro de construção, seguro de responsabilidade civil (terceiros), seguro de responsabilidade civil ambiental e seguro de vida
Pós entrada em operação: seguro de riscos operacionais e responsabilidade civil operações, D&O
Possíveis proteções securitárias
Em projetos de energia, é possível, por exemplo, fazer o seguro de responsabilidade civil. Ele é responsável pelas indenizações a serem reclamadas por terceiros, que não os envolvidos na obra, que sejam lesados através de danos materiais e/ou corporais, incluindo os empregados envolvidos na obra que possuam qualquer tipo de vínculo contratual. Esse seguro pode também ser contratado pelo proprietário ou pelo EPCista, sendo que todos os subcontratados estarão abarcados por essa apólice tida como “guarda-chuva”.
Existe outra classe de seguro de responsabilidade civil: o de responsabilidade civil ambiental que protegerá a fauna e flora contra poluição.
De forma geral, em projetos de geração e transmissão de energia, observa-se as exposições de danos a empregados principalmente em projetos com trabalho em altura.
É pactuada também a questão associada a danos diretos ou indiretos causados por empreiteiros e fornecedores, cuja atenção deve ser redobrada em projetos de retrofit caracterizados como brownfield frente a projetos em áreas sem nenhum tipo de construção prévia (greenfield). Nesse caso, parte e contraparte fazem seus próprios seguros para cobrir os riscos pactuados.
Também existe a proteção contra exposição de lucros cessantes a terceiros em estruturas compartilhadas, pois o dano pode afetar a geração, transmissão ou distribuição por dias, afetando a perda de receita em grandes montas.
É possível, por exemplo, cobrir o risco de perda de receita futura associada à geração, que será coberta pela compra de energia no mercado livre e/ou regulado ou no Mercado de Curto Prazo (MCP) a fim de honrar as obrigações pactuadas no contrato de comercialização podendo ele ter sido negociado antes ou durante o projeto.
Também do ponto de vista do risco de perda de receita futura associada à geração, a cobertura de lucro futuro é de interesse do proprietário e/ou empreendedor, assim como dos financiadores que a requisitam quando é feito o financiamento através de lenders (investidores internacionais) que possuem uma maior maturidade em cenários de riscos e seguros.
Por fim, o grande alicerce da negociação entre um empreendimento e seu prestador de serviço é o seguro garantia, que serve para amparar as devidas obrigações contratuais entre as partes. Ele é utilizado como se fosse uma caução, é acionado no caso de não cumprimento das obrigações e pode ser exigido em diversas fases do projeto, como durante o BID, durante a execução ou durante a performance.
Pontos relevantes para contratar o seguro
No momento de fazer o seguro, alguns pontos são bem importantes:
a questão associada a ativos existentes e seus eventuais lucros cessantes. Por exemplo: no momento de firmar o seguro para uma subestação compartilhada, deve-se levar em consideração a possibilidade de ocorrência de dano a um transformador de terceiros impreterível para a sua prestação de serviço, e consequente recebimento de receita, que não estava no escopo do seguro. Deve-se levar em consideração também a possibilidade de um empreiteiro causar dano a um ativo do próprio proprietário que o contratou, ativo esse que não estava no escopo dos trabalhos a serem realizados daquele contrato;
o caminho crítico do projeto. Por exemplo: um projeto de geração eólica e solar possui poucos gargalos do ponto de vista da geração de energia e, então, a perda de um único aerogerador, de uma placa ou de um inversor não afetará diretamente a geração de energia. Já para o projeto de uma subestação, se ocorre um problema com o trafo, toda a operação do empreendimento fica comprometida – logo, diferentes criticidades demandam diferentes seguros;
o seguro de transporte até o canteiro de equipamentos com lead time crítico. Por características dos novos projetos, principalmente em solares, a grande participação de fabricantes chineses e cadeias logísticas cada vez mais complexas promovem a análise da contratação da cobertura de perda de receita por conta de um dano ocorrido durante o transporte. Essa cobertura é equivalente a perda de receita da apólice de riscos de engenharia, porém para danos associados ao transporte desses equipamentos;
a quantidade de fornecedores de equipamento no mercado (por exemplo, há pouquíssimos fornecedores de trafo no Brasil, o que o torna um equipamento com necessidade maior de seguro); e
a negociação do Incoterms, que são os termos internacionais de comércio. São basicamente as formas de negociações de compra e venda de mercadorias, feitas entre importador e exportador e que são responsáveis por estabelecer os direitos e obrigações de ambas as partes no contrato;
Considerando as diversas formas de transferência de riscos, a correta alocação e negociação e dos riscos durante a concepção de um projeto são fundamentais para seu bom andamento e para o balanço de risco entre os envolvidos.
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